Quebrando Pré-Conceitos: Feminismos - #4

Preâmbulo:

O Símbolo de Vênus
Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, feminismo pode ser definido como: 1. doutrina que preconiza o aprimoramento e a ampliação do papel e dos direitos das mulheres na sociedade; 2. movimento que milita neste sentido; 3. teoria que sustenta a igualdade politica, social e econômica de ambos os sexos [...]
No Brasil do século XXI, o termo gera polêmicas, impasses e debates, por haver uma relação errônea de superioridade do sexo feminino (femismo) com o feminismo, que se trata de uma luta justa pelos direitos das mulheres de todas as etnias e gêneros. Se trata de um movimento secular, necessário e decisivo quando relacionado ao papel da mulher na sociedade e, cada vez mais depredado pela figura do patriarcado, que impõe à vítima o contraponto à sua própria salvação.
Apesar de todos os direitos conquistados como o direito ao sufrágio, à educação, à independência e ao trabalho, há desigualdade salarial e funcional; uma média 12 mil casos motivados pelo feminicidio (violência ou assassinato motivada simplesmente por a vítima ser do sexo feminino) por por dia; aproximadamente 130 casos de estupro diários. De fato, a situação da mulher brasileira é penosa, mesmo desconsiderando os casos de assédio e violação.
Os ideais feministas surgem das ideologias iluministas que em teoria defendiam a igualdade social entre todos os indivíduos, pois viviam grande repressão e à elas não cabia a prática da igualdade, que por isso, acreditaram que uma saída seria a aplicação do iluminismo. A expectativa criada pela Revolução Francesa (revolução de cunho iluminista), que fora tão apoiada pelas mulheres, foi quebrada logo após o evento, pois os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade cabiam somente ao gênero masculino, excluindo as mulheres da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão. Com a chegada de Napoleão Bonaparte ao poder e a outorgamento do Código Civil em 1800, os direitos ficaram ainda mais restritos, pois a lei dizia que as mulheres deviam submissão aos maridos e, até mesmo seus salários. Como resultado, o movimento foi cada vez tomando mais força, o que será explicado nos tópicos à seguir.

Primeira Onda Feminista:

A Primeira Onda Feminista, foi o movimento intelectual com focos na Europa e América do Norte e que buscava revindicar às mulheres os direitos básicos civis. 
Uma mulher francesa chamada Olympe de Gouges toma como ato inicial a replicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, transcrevendo para a forma feminina como Declaração Universal dos Direitos da Mulher e da Cidadã, o qual propunha igualdade de direitos civis às mulheres. Do outro lado do Atlântico, uma mulher estadunidense chamada Mary Wollstonecraft (mãe de Mary Shelley, autora de Frankenstein), publica o seu Vindicação dos Direitos da Mulher, sendo considerado o texto que funda o feminismo. Os textos citados diziam, que diferentemente do que se acreditava, a superioridade do gênero masculino se tratava de algo cultural replicado pela educação moral e, não uma causa natural e por determinação divina. Como citado no post "Uma Dose de Cultura", toda alteração cultural é recebida com algum tipo de resistência e até mesmo opressão: Olympe de Gouges acabou executada, muitas ativistas encarceradas e proibida a reunião de mais de cinco mulheres em público.
Apesar de terem sido apenas movimentos intelectuais, foram de suma importância para a ativação do pavio feminista e do questionamento da mulher contemporânea. Em suma, forneceram a lenha para as próximas movimentações de ação e prática, pois o medo e a opressão eram instrumentos que cada vez mais penetravam no espírito democrático e na consciência de liberdade das mulheres.

Segunda Onda Feminista:

A Segunda Onda Feminista ou Sufragismo, foi o movimento intelectual e social com focos nos países anglófonos, principalmente Reino Unido e Estados Unidos, que buscava às mulheres o direito ao voto (sufrágio). Segundo conceitos jurídicos, o direito ao voto também é um direito à cidadania, pois a cidadania se define como condição de pessoa que, como membro do Estado, tem gozo nos direitos de participação da vida política. Isso nos remete a voltar ao que foi dito no preâmbulo, podendo reafirmar a negação da mulher como cidadã e componente essencial na estruturação da sociedade.
As Sufragistas, além de perseguidas e oprimidas, eram vítimas de encarceramento, difamação e até mesmo execuções e torturas. Segue um exemplo de cartaz da época:
Em inglês: "O que eu devo fazer com as sufragistas"
Através de uma luta dura, com sabotagens a líderes políticos e até mesmo bombas, as Sufragistas conseguiram num âmbito mundial, porém em datas diferentes, o direito ao voto. O voto era exclusivo para mulheres da elite, brancas e maiores de 30 anos de idade. Exemplos: Reino Unido em 1918; Nova Zelândia em 1893; Estados Unidos em 1920; Brasil em 1932; Rússia (ou República Socialista Federativa Soviética da Rússia) em 1919.

Simone de Beauvoir:

No período entre a Primeira e Segunda Guerra Mundial, o feminismo acaba perdendo o folego. Muitas mulheres já tem direito ao voto, já estão ingressadas na universidade e tem certa autonomia. Porém, surge uma das peças mais importantes para o intelectual feminista, a filosofa francesa Simone de Beauvoir com seu livro: "O Segundo Sexo". Em sua teoria, pode-se destacar a famosa frase:
"Não se nasce mulher, se torna!"
Simone de Beauvoir
Para Beauvoir, a mulher não se define pelo seu sexo biológico, mas por uma série de distinções sociais incumbidas, que terão que se sucumbir para que sejam necessariamente mulheres, como ser apta à cozinha, a ser mãe, delicada, sentimental e afins. 
Beauvoir também teoriza um tipo de imposição chamada "Androcentrismo", que diz que na sociedade patriarcalista, o homem é "a norma" e a mulher "o outro". Isso, em suma, impede a mulher de seguir seus próprios conceitos e seu próprio objeto, pois acaba se prendendo ao que o homem contextualiza  e espera sobre ela.

Terceira Onda Feminista:

Nesse período, devemos nos focar ao que se passa no lado capitalista da Cortina de Ferro. Findada a Segunda Guerra Mundial e em prática o American Way of Life, se materializa ainda mais a mulher como serva de casa. Acredita-se que a felicidade feminina está no consumo dos melhores produtos domésticos (batedeiras, liquidificadores, geladeiras, fogões) e no serviço ao marido. 
No entanto, a prática não sai como a teoria. Mulheres acabando enfermas, depressivas, ansiosas e mergulhadas no álcool. Surge então Betty Friedan, com o livro "Mística da Feminilidade", onde coloca o homem como um problema que não tem nome e, diz que as mulheres vivem em situação de insatisfação por estarem priorizando desejos de terceiros ao invés dos próprios. Começa aí, com a criação do NOW (National Organization for Women), uma grande mobilização nacional que busca mudar o estilo de vida das mulheres no âmbito pessoal. Conscientizadas, o movimento obtém sucesso. Começa aí o Feminismo Liberal.
Propaganda de Refrigerador
Apesar de todas as conquistas, a violência doméstica, excesso de tarefas e outros problemas no âmbito pessoal continuam. Surge aí o Feminismo Radical (ou de Raiz) e a luta contra o patriarcado por definição. Com o Movimento de Liberação da Mulher, manifestações foram organizadas contra objetificação da mulher como objeto sexual e de prazer visual, centros de apoio e recebimento para mulheres violentadas, centros de defesa pessoal.
Após anos de luta, nos anos 90, o feminismo passa a deixar de servir um único protótipo de mulher, ganhando ramificações de acordo com o grupo étnico, físico, sexual e de gênero, passando a atender também às mulheres transexuais, mulheres muçulmanas, mulheres africanas e mulheres asiáticas. Quebra-se o conceito de que existe apenas um preceito e tipo de mulher.

Alguns Feminismos:

Feminismo Radical: vê que os motivos da opressão são classistas e dos papéis sociais conciliados aos gêneros. Considera que o problema só será resolvido na erradicação total do patriarcado e do sistema patriarcalista.
Feminismo Liberal: diz que o melhor modo de assegurar igualdade entre homens e mulheres, é a partir das reformas políticas e legais. É o feminismo do empoderamento, que diz que a ocupação de grandes cargos e visibilidade midiática são essenciais para a luta da igualdade.
Feminismo Negro: coloca em questão o duplo preconceito sofrido: o sexismo e o racismo, não se sentindo representadas pelos outros feminismos. Coloca em pauta a intolerância religiosa e genocídio das massas negras.
Transfeminismo: tem como principal objeto de luta o reconhecimento da mulher trans como mulher, e não um "homem cis vestido de mulher". Se aproxima mais dos movimentos LGBTQ+, mas não deixa a raiz feminista.
Teoria Queer: se define como toda pessoa que não segue o modelo heterossexual ou de gênero binário (homem e mulher). Refere-se ao gênero e identidade sexual como resultados de construções sociais e à opressão que se é exposto na indução de "educações sexuais", tendo que ser combatido ou amenizado.

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